14/01/2017

Regionalismos (parte 2)


O “comer” está pronto!

Quando se fala em regionalismos, rapidamente nos vemos empurrados para discussões em torno da pronúncia desta ou daquela região. Acontece que eles também ocorrem em outros planos de análise (lexical, sintático, morfológico ou semântico).
Também não vou dedicar esta minha pequena reflexão às velhas questões de variedade lexical, elencando palavras típicas desta ou daquela região. Sobre isso, já muito de disse e não menos foi escrito.
Há dias, fui convidado por um amigo para almoçar na sua casa. Foi um momento agradável, não só pelo que se comeu, mas sobretudo pelo que se conviveu. Era uma massada de bacalhau, confecionada à boa maneira beirã. Até aqui, nada de especial resulta para os propósitos da língua portuguesa. Acontece que, a dada altura, esse meu amigo trouxe até nós a panela com o delicioso petisco (já anunciado pelo aroma prometedor que antes entrara na sala), enquanto proferia a seguinte frase:

- O comer está pronto!

Ouvi e registei. Estava encontrado um regionalismo que a muitos passa despercebido. O “comer” usado como nome (ou substantivo). Não, não se trata de um mero uso nominativo de um verbo. O que aqui está em causa é outra coisa diferente.
Vejamos os seguintes exemplos:

(1)    O correr faz bem à saúde
(2)    O dançar liberta-nos
(3)    O escrever ajuda a precaver erros de ortografia
(4)    O comer está na mesa

Em todas as frases, temos o uso nominativo de verbos (correr, dançar, escrever e comer), algo perfeitamente comum na nossa língua. No entanto, só em (4) temos esse uso para um referente concreto, isto é, para um produto (o comer em vez de comida). Já em (1), (2) e (3), estamos na presença de um frequente uso nominativo de verbos, referenciando processos e não objetos/coisas.
Bom, agora tenho de terminar, porque tenho de ir fazer o “comer”.

Até já.

2 comentários:

  1. Que comer tiveste que ir fazer, Alcídio?
    :-)

    Bom 2017!

    ResponderEliminar
  2. Alex, fiz uma roupa-velha que estava uma delícia.
    Um manjar dos nossos tempos!
    Como costumas dizer,
    Abrax.

    ResponderEliminar