Sirvo-me desta nota introdutória
como mote de reflexão em torno das chamadas línguas inclusivas e neutras. E,
desde já, vinco a minha total discordância quer em relação a uma, quer em
relação a outra. Os modismos são o que são e valem o que valem. Vejamos,
primeiro, em que é que consiste cada um destes conceitos:
1 – Linguagem inclusiva (não sexista)
Trata-se de uma suposta variante
que, não se propondo alterar o léxico da LP tal como o conhecemos, advoga uma
comunicação pretensamente não discriminatória, sob o ponto de vista do género. Vejamos
um exemplo muito recorrente: “Portugueses e portuguesas…”, quando um orador se
dirige a um público compósito (homens e mulheres);
2 – Linguagem neutra (não binária)
Prossegue os mesmos objetivos da
linguagem inclusiva, mas altera palavras já existentes ou introduz novos
vocábulos. É o caso da neutralização das desinências de género do pronome “todos”.
Vejamos um exemplo concreto: “Saiam todes da sala!”
Na base destes dois tipos de linguagem,
estão conhecidos movimentos feministas de todo o mundo, bem como organizações inclusivas
de pessoas de diversas orientações sexuais e identidades de género.
Desenganem-se todos aqueles que veem na eclosão destas linguagens meras
iniciativas efémeras. Não, estas linguagens estão a afirmar-se em todos os
cantos do planeta, nomeadamente na Europa. Tomemos como ilustrativo o recente
caso ocorrido em França, onde o respetivo poder político vetou o uso da chamada
gramática igualitária em documentos oficiais, com a devida concordância da
Academia Francesa que chegou mesmo a referir-se a esta tendência linguística
como “um perigo de morte para a francofonia”.
A flexão em género é uma característica do
nosso idioma, à imagem do que acontece, genericamente, com as restantes línguas
neolatinas. Sobre a origem desta flexão, nomeadamente da predominância do
género masculino em algumas palavras (outrora com desinência neutra), já me
pronunciei num artigo anterior, também aqui publicado. Alterar este status quo linguístico em nome da
igualdade de género não faz para mim o menor sentido. É urgente acabar com
aquilo que aqui rotulo como vanguardas fundamentalistas e que estas linguagens
acima explicitadas não passem de um mero processo de intenções. Imagine-se
termos agora que expandir os nossos dicionários com entradas de género regular:
gato/gata; menino/menina... NÃO, OBRIGADO!
As sociedades ainda permanecem fieis à
sua matriz machista, é certo, mas não se remedeia um erro com outro erro. Não é
pelo facto de um político iniciar os seus discursos com expressões como
“portuguesas e portugueses” que se combate a discriminação de género. Haja
coragem para o fazer, mas sem se recorrer a adornos linguísticos estéreis ou a
quaisquer outros atavios infecundos.