03/09/2016

Língua-de-trapos 4

Tribute-se as Finanças pelo mau uso da língua.



Sempre defendi que o erro de ortografia, não obstante a vergonha sociolinguística que provoca, não é a caixa de Pandora do uso escrito da nossa língua. No caso concreto do Portal das Finanças, seria bastante embaraçoso para os seus administradores se, em vez de “Aduaneira”, escrevessem “Adoaneira”. No entanto e na perspetiva do contribuinte, tal erro em nada interferiria no preenchimento do modelo 3 do IRS, não indo as suas consequências além de um simples comentário mordaz sobre quem o cometeu. Já o mesmo não pode ser dito, quando o que está em causa são enunciados redigidos sem rigor comunicativo (por desleixo ou por preguiça), geradores de ambiguidades que podem inviabilizar um correto preenchimento do referido documento.
Este ano fui confrontado com duas situações ambíguas que me fizeram vacilar na informação prestada à Autoridade tributária e aduaneira (AT):

1.º enunciado (Anexo H – Benefícios fiscais e deduções; Quadro 6 - C; DESPESAS DE SAÚDE, FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO, ENCARGOS COM IMÓVEIS E COM LARES)

«Em alternativa aos valores comunicados à Autoridade Tributária e Aduaneira, pretende declarar as despesas de saúde, de formação e educação, os encargos com imóveis e os encargos com lares relativos ao agregado familiar?»  Sim       Não

Colocada a questão nestes termos, um contribuinte que não queira ter o trabalho de lançar as despesas manualmente, preferindo que sejam vertidos neste quadro os encargos anteriormente comunicados à AT, não hesitará em clicar no botão “não”. No entanto e para seu espanto, nenhuma informação é inserida automaticamente com esta opção. De imediato, irá clicar no botão “sim” e verá todas as despesas aparecer no quadro, concluindo que foi induzido em erro.

2.º enunciado (Anexo H - Benefícios fiscais e deduções; Quadro 7; INFORMAÇÃO RELATIVA A DESPESAS E ENCARGOS COM IMÓVEIS PARA HABITAÇÃO PERMANENTE

«Se o imóvel que constitui a sua habitação permanente se situa na União Europeia ou no Espaço Económico Europeu, indique o código do país.»

Tive de preencher este campo, uma vez que a minha habitação se situa em Viseu; cidade de Portugal; país da União Europeia. Que responder num caso destes? Supostamente, seria para deixar o quadro em branco, uma vez que a lista de países que nos é dada por defeito não contempla Portugal. Mais uma vez, fui atraiçoado pelo enunciado fiscal.
Resumindo: já não basta a complexidade técnica da declaração de IRS, ainda tem o contribuinte de recorrer a processos inferenciais, para poder preencher a dita, completamente armadilhada com ambiguidades e “lógicas da batata”.

2 comentários:

  1. Os "adoanos" têm a lógica avariada.
    Os "adoanos" não têm o aspirador de recursos do contribuinte avariados.
    :-)

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  2. É isso, Alex.
    Como tu próprio dirias, o aspirador dos "adoanos" é quilhado a quilhar os nossos bolsos.

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